Diário de uma Paixão

terça-feira, outubro 30, 2007

Planos e falhas

O que é que vais fazer na passagem de ano?
Eu vou fechar-me ao mundo com uma garrafa de vodka ao contrário do ano passado.
Consegui permanecer sóbria e sociável,consegues imaginar?Nem foste capaz de me ligar...
No fim de contas,acabou tudo ali.Embora só se tenha iluminado essa ideia na minha cabeça uns meses depois.Apenas longos meses depois me apercebi que o que tinha acontecido,e as nossas atitudes,tinham ditado o fim.
Lembro-me de tantar apaixonar-me por quem estava lá,e não conseguir tirar a tua imagem da cabeça.Lembro-me de nos meses que se seguiram,até a este preciso momento,não a conseguir retirar totalmente.
Onde é que estarás este ano?...E com quem?
O ano passado disseste que era o primeiro ano que passavas com namorada,tal acabou por não acontecer.Era o meu primeiro,tambem.
Eu vou fugir do mundo e encharcar-me em sono,para acordar em 2008.Ainda faltam 2 meses,aposto que já andas a planear...
Será que acaba tudo este ano?Será que acaba tudo antes de chegarmos ao fim?
Fizemos tantos planos,e cometemos tantas falhas...

domingo, outubro 28, 2007

Fragmentos

Nos rostos daquela gente,um espelho do avesso era o que eu admirava.Todo o oposto e negativo que sinto em mim,lá estava no reflexo sujo de umas quantas pessoas maquilhadas em exagero.
Perdi-me por instantes ao ver-me,do outro lado do espelho,dei por mim a jogar todos os meus trunfos.Todas aquelas forças que ainda tinha para obrigar os meus olhos a chorar,em vão.Gritei até me doer a cabeça e o estomago,e não sentir nada mais.Como se o resto do corpo estivesse ali de pé,tremido,sem o meu controle.Gritei uma vez mais,já não importava que ninguem ouvisse,até porque os seus gritos de falsidade soavam mais alto que os meus,por não conseguir que saíssem dos meus lábios.Cerrei os punhos tal e qual como se tivesse 5 anos e não me quisessem dar um rebuçado.Deixei marcas de sangue pisado na palma de ambas as mãos,e mordi-me até fazer ferida.Pelo menos esta,um dia,vai sarar,pensei eu.O Sol forte fez com que chorasse,um choro involuntário,como um homícidio.Ainda assim não estava ninguem em volta para o poder comprovar,não havia testemunhas,limpei os óculos escuros e segui em frente.
O espelho perseguia-me por todos os corredores,com todos aqueles nomes que não conhecia e me faziam andar mais rápido que o meu próprio corpo.
Parei diante dele,afastada da multidão teatral,e pedi-lhe que se virasse,pedi-lhe que me mostrasse o verdadeiro reflexo,não aquele abstracto e surreal.A sua resposta foi simples e directa.Um silencio devastador em resposta aos meus berros de desespero.Um desprezo indiferente à minha voz rouca que não se ouviu durante 2 dias.Ao qual não consegui mais passar ao lado.
Num impulso de revolta,bati-lhe.Bati-lhe até ver sangue escorrer pelas minhas mãos e pelos meus braços,bati-lhe até as minhas lágrimas se chamarem voluntárias,bati-lhe até que quebrasse.Quando já não havia reflexo,olhei os pedaços espalhados pelo chão,e intoxicada com o pó com que ele me vestia,nada tinha mudado.
Abandonei aquele lugar horrendo deixando para trás uma série de fragmentos de memória.Não tenho mais de quem fugir a não ser deles.
Só gostava de os poder colar,pedacinho a pedacinho,fragmento a fragmento...Para os poder partir novamente.

sábado, outubro 27, 2007

A Senhora

Hoje vi a velhota castiça que vivia naquela casinha velha com umas canas em volta.Sim,aquela varina que toda a vila conhecia,e com quem dizem,sou parecida.Rebelde e namoradeira.
Olhei para ela,e apesar de branca e fria,sem o seu chapeu caracteristico de pesca,com os poucos fios de cabelo cinzentos espalhados sobre um manto branco,era ela.A velhinha que gostava da rua sésamo,dos marretas,do Manuel Luís Goucha...E de ter bolinhos de mercearia guardados para os netos,numa caixinha metálica azul.
A senhora que cantava fado e ouvia rádio,já não vai poder guardar mais os meus bolinhos preferidos,nem contar histórias de quando fugia de casa para ir namorar.
Era uma senhora sem estudos,não sabia ler nem escrever,mas contou-me as melhores histórias que já ouvi,e entendia apenas pelo meu olhar se estava triste ou contente.
Lá estava ela estendida,com as suas mãos cheias de reumático,e umas quantas pessoas a choramingar a sua viagem.Eu,não fui capaz de chorar.Sentei-me longe dos grupos,longe dos choros,e das conversas de igreja,e pensei no que ela tinha sido.Imaginei-a a dizer "oh neta cheiras tão bem,tens de emprestar o teu perfume à avó para irmos ao baile".Imaginei-a a meter-se comigo para lá levar um namorado.Imaginei-a a dizer asneiras enquanto ralhava com os gatos,e levantar-me a saia para me dizer que tinha um rabo jeitoso.
Não me despedi dela.Sabia que devia tê-lo feito,por alguma razão não o fiz.
A velhinha castiça e desdentada...Parecia tão bem.Porque é que não dizes nada?Porque é que não me chamaste?
Só gostava de poder chorar,só isso.Será pedir muito?

Adeus avó,desculpa.

sexta-feira, outubro 26, 2007

Egoísmo imperativo

Faz-me sentir bonita,mente-me.
Preciso que me mintas,diz que as minhas olheiras têm algo de especial.Diz-me que o vestido me fica bem,diz.
Faz-me sentir diferente,elucida-me.Acaricía-me os ombros e faz com que os sinta como nunca senti.Diz-me que as imperfeições são fruto da imaginação de inseguraças.Rápido!
Mente-me,com o teu mais sincero olhar.
Toca-me naquele ponto fraco,que só tu e eu sabemos.Fazia-te sorrir,faz-me sentir completa!
Faz-me festinhas no cabelo e diz-me como te perderias nas suas ondas...Perde-te em mim,nos meus ódios.
Não digas a verdade mesmo que já não me magoe,ressuscita-me.Apressa-te a mostrares-me o meu lado luminoso,tu sabes que existe,ainda que não o queiras ver.
Diz-me que não me amas,nem me adoras,diz apenas que me achas bonita.Faz-me a vontade,amor.
Faz-me sentir bonita outra vez,mas não fiques.Vamos evitar os erros,consegues?

Faz-me sentir bonita,e vai-te embora.

quinta-feira, outubro 25, 2007

SOS

Mensagem recebida,hoje,às 5:14.
O fim chegou há muito mais do que prevera.Deu-se a confirmação de que nada existe,é tudo um sonho contado em metáforas e mentiras,sustentadas em hiperboles de consolação.
O ínicio não foi senão um aparte aquando do vazio.Só percebemos a realidade após vê-la na inexistência de uma sequela quebrada em juras sem sentido,somas sem resultado.
Entre linhas,resta um pequeno espaço para sentir o que na verdade é,sem nunca o ser.A abstracção das coisas,a indiferença do amor,a insuficiencia da amizade...
Chega-se então à conclusão que por muito que façamos,nunca é suficiente para o que é necessário.Precisamos sempre de mais,demais.Uma incapacidade extrema de alcance.
Mais perto...Só um centimetro mais perto,só um minuto mais cedo,só uma mão mais forte noutra.Nunca é forte como se esperaria.Expectativas não compensam o acontecimento.
Mensagem enviada a data desconhecida.
Deixamos pendentes os motivos e as razões em mensagens que pairam no ar que respiramos,quando finalmente são entregues,já não têm o mesmo significado.O mesmo texto.
O silencio,esse,é o melhor amigo do ser humano.Evita-o de fazer estragos.Para quê dizer "sim" ou "não",para quê fazer sexo quando se pode apenas demonstrar desejo?...Porque gostamos de sofrer,gostamos de falhar,gostamos de enviar mensagens de esperança e positivismo quando na verdade são apenas consolos,mentiras profissionais que se utilizam como exposições de arte numa galeria vazia.
Sós.Estamos todos sós.Quando não o estamos,mentimos.Mais uma vez,"só" mais uma.E essa antecede outra,e mais outra,e mais umas quantas que perdem a conta entre si num monólogo falso de emoção.
Somos tão diferentes que quando nos apercebemos finalmente,após 20,40,80 anos,já é tarde.Chegamos ao fim da linha sem nos despedirmos daquilo que deixamos para trás,pensando que vão entender sem imagens em directo.Seria tudo tão diferente a preto e branco...
As mensagens são enviadas,são recebidas,respondidas,confirmadas,e ainda assim a comunicação é igual a zero.Tendendo para menos infinito.
Às vezes só queremos estar sós.No entanto,são esses os instantes em que felizes nos esquecemos que na realidade,nunca o deixamos de estar.Nunca.
Falhou o envio da mensagem.

terça-feira, outubro 23, 2007

Desculpa...

Eu sei que era a tua esperança num mundo melhor.A mulher que ia fazer um curso de grandes homens,talvez seguir política,talvez medicina...A mulher criança a quem ensinaste inglês,porque sabias um dia ela querer muito mais do que Portugal teria para dar.Sei que fizeste o que podias.Sei que não consegui fazer melhor.
Fui a maior desilusão da tua vida,apenas já cá não estás para o dizer.
A mulher que ia mudar o mundo é uma falha.Não estiveste cá para a criar até ao fim,e o teu filho nem sequer tentou.
Gostava de poder sentir que te orgulhas de mim,que continuas a achar-me parecida contigo,com forças para tudo e mais alguma coisa...Se ao menos pudesse visitar-te.Queria tanto pedir-te desculpa...Por tudo.
Eu sei que deves neste momento estar a sentir vergonha.Vergonha por não me teres deixado em boas mãos.Dava tudo para que não estivesses triste.Dava tudo para que me desses uma luz,queria tanto acreditar que tudo vai mudar.Que vou poder cumprir todos os objectivos que tinhas para mim.Já não consigo.
Tinha tanta força,onde está ela agora?Quando foste embora eu não consegui chorar e agora...Agora acho que estás a ver.
Hoje só me resta a vontade de ir ter contigo,finalmente.
Desculpa avô.

"Click"

Ouvi um barulho,que me soou familiar.
Como se fechasses a porta ao sair,do meu coração.
Acho que é a minha vontade,unida aos meus desejos,a gozar comigo.
Pode ser apenas uma ameaça.
Na volta é só mais um falso alarme...
Mas finalmente começo a ficar farta.
Até que enfim consigo respirar um dia inteiro sem pensar em ti!
Continuo com medo de estar sozinha,não é defeito,é feitio.
Já não quero que voltes.
Só quero apagar-te.
Consigo de uma vez por todas sentir-te raiva,e alguma indiferença.
Não sei se vai durar...Não sei.
Neste momento se te pudesse dizer alguma coisa,seria isto:

Pega nas tuas drogas e sai.
Sai.
...E nunca mais voltes a entrar.

segunda-feira, outubro 22, 2007

O piano

Era uma menina como outra qualquer.
Aos sábados de manhã,bem cedinho,desligava o despertador,ligava a aparelhagem com os seus cds de punk-rock tipicos de anos 90,e fazia força para se levantar.Silenciosamente para não acordar ninguem.Vestia o seu vestido branco com flores garridas,que já lhe apertava o peito que crescia a olhos vistos,calçava as suas sandálias amarelo torrado,pegava na mala e nos livros,e saía de casa.A porta rangia como se gritasse "não voltes!".
Andava insegura e inocente a evitar os vizinhos que achavam estranha a sua saída tão cedo,sozinha.Largava meia duzia de "bons dias",com a sua voz timida e doce,tremia o sorriso e apanhava o autocarro para o centro da cidade.Toda a gente olhava sorridente.Ela escondia-se por entre a multidão.Nunca ninguem soube o que a levava àquela hora a um sábado,para um lugar tão perigoso,pelo menos a ela.
Descia,atravessava a estação com olhar de quem procura alguem,mas na verdade apenas se procura a ela mesma,e entrava num prédio de poucos andares,com um placar cheio de fotografias à porta.Olha de relance para a sua,e sobe as escadas na esperança que ninguem note que é ela que ali está,num retrato à moda antiga sentada a um piano.
Diz bom dia à senhora da recepção e entra numa sala com pouca luz,procura um piano vazio para praticar.Coloca os head-phones,perde-se na musica até que chega um senhor já de idade para lhe dar uma aula.Para ela,o recreio não era o intervalo de meia-hora na escola,nem um fim-de-semana na cama até tarde,era aquilo.Libertava-lhe a alma.Sentia-se independente e responsavel,porem,havia tanta culpa e tanta pressão,que um dia decidiu que nunca mais tocaria com um dedo num piano.As teclas simbolizavam o que menos gostava,a prisão de ser adulta precocemente.
No regresso a casa,chorou por entre as ruas solitárias que a levavam a casa,limpou cuidadosamente as lágrimas ao entrar no prédio,e disse aos pais que não queria ir mais.
Quase 10 anos depois continuaram a culpa-la de ter deixado a escola de musica.Exibem fotografias e videos de audições para as quais chorou na casa de banho antes de entrar.As quais odiava por serem observadas por dezenas de desconhecidos que a criticavam ou elogiavam,sem ter em conta a sua idade.
Na realidade a menina do piano,que não sabia o que queria ser quando fosse grande,tinha apenas 11 anos.Gostava de se sentar na beira da sua janela em dias de chuva a escrever poemas sobre coisas que ainda não conhecia,amor,ódio,saudade,filosofia...Gostava de jogar futebol e de ver filmes de terror psicológico.E fazia compras sozinha,ao contrário das suas colegas cujos pais não deixavam sair para alem do fundo da rua.
Tinha apenas 11 anos.

domingo, outubro 21, 2007

Decadência

Primeira paragem: Clandestino.
A minha mala escondia um copo de shot pegajoso.O meu cabelo,caracois fictícios de carícias personificadas,e nós maiores,do que eu própria podia desfazer.
Próxima paragem: Lisbona.
O meu corpo escondia uma leveza falsa e uma dor instável instalada.As minhas calças,pingos de vómito e Golden Strike.
Próxima paragem: Miradouro de Sta. Catarina.
Toda eu era um armário,um esconderijo de coisas que mais ninguem quer ver.Os roubos,os pecados,os ódios...Os arrependimentos.
Acordei com o barulho já familiar de vómitos,não eram meus.Acordei com o balbuciar de coisas já saturadas de me falar,e consequentemente já saturada deste acordar cruel.
A ressaca era tão menos penosa se não houvessem motivos para a bebedeira.
Lembro-me de estar feliz,lembro-me do roubo dos copos e da insignificante preocupação deles se partirem.Lembro-me de mensagens a alguem que estava ausente,e que fazia tanta falta.Lembro-me de não querer que o tempo andasse,de querer ficar ali.No entanto o relógio traiu-me,e a manhã chegou depressa levando consigo as ilusões de bem-estar que me tinha criado.
6:30,ainda noite.Vi o caminho passar,as praias iam falando comigo e diziam que a luz estava quase a chegar,e o meu destino tambem.
Penultima paragem: Cascais.
Arrumo o leitor de mp3,e vou.Não cheguei a perceber para onde tinha vontade de ir,o unico sitio ao qual me soube encaminhar foi este.Onde 5 ou 6 horas depois escrevo sobre o assunto sem me apetecer.
1 litro e meio de água depois.Uns quantos sonhos e pesadelos depois.Uns quantos gritos...
A princesa beija o sapo na esperança deste se transformar em príncipe.Eu beijo sempre o sapo errado.
Não me sinto mal,já lá estive,passa depressa.A decadência tem o poder de me fazer levantar,de me fazer cair,subir e descer,dar a volta e regressar.A beleza dela é a piada do dia a seguir,na dor de cabeça e no arrependimento.Já não vivo sem ele.
Lembro-me de estar feliz.Talvez ainda tivesse esperança em tornar o meu sangue alcool,e tornar essa sensação permanente.
Ultima paragem: Cama.

sexta-feira, outubro 19, 2007

46 & 2

Há 4 minutos passou um avião.
Pedi um desejo para minha salvação.
Tal azar,tal sorte,disse-me que não.
Mas eu continuo a sonhar...
Não vá ele regressar
E estender-me a mão.

Há 6 dias ouvi um sim.
Pedi um desejo,para não ter fim.
Tal destino,tal sorte,pensei para mim...
Vou continuar a tentar,
Não vá ele atrás buscar
O que me deixa assim.

Há 2 horas pensei voar.
Pedi um desejo,para me soltar.
Tal feitiço,tal azar,deixei-me calar.
Quero cair,quero planar...
Não vá atraiçoar-me o ar
E não me deixar nunca mais voltar.

quinta-feira, outubro 18, 2007

Bairro Alto

As estradas cruzam-se sem sentidos obrigatórios.Perco-me como te pisasse pela primeira vez,e a perda sempre me fascinou.
As paredes sujas falam em linguas que só os que lá passam entendem,nem sempre dizem alguma coisa,porem,comunicam como se dissessem algo.Transmitem uma mensagem de paz e desespero.
Quando te passo impune a lembranças,apercebo-me do quanto és importante,do quanto me fazes sentir em casa.Do quanto as tuas portas me fazem regressar a um lugar que nunca me foi familiar.És especial,porque me deste e tiraste no mesmo valor.Paguei-te em dinheiro e musicas aquilo que me ofereceste sem pedir nada em troca.Ofereceste-me esperança,vida,e amor.Tiraste-me as 3,mas mesmo assim não te consigo culpar ou desejar mal.Continuo a visitar-te sempre que posso,porque sei um dia alcança-las de novo,ou talvez não tenha a certeza.A incerteza faz-me prender à segurança do passado,e um sonho de futuro.
Quebrei-te copos no colo,e cantei-te melodias que me diziam muito.Chorei-te lágrimas que nunca consegui chorar noutro mundo.Embora não respondas directamente,sei que as ouves,sei que as sentes.Ainda não me deixaste em silencio desde que te conheci,torna-te unico e indivisivel.
Passados estes anos de paixão intensa,posso finalmente dizer-te que apesar de não te conhecer por completo,tenho vontade de te conhecer aos poucos,de te devorar todas as ruas e bares.
Sei que se pudesses descrever-me,seria apenas uma menina vestida de preto a passear-te em busca de mais um copo de vodka,à espera que o amor lhe tocasse no ombro e a levasse.Uma menina que nunca vai deixar de o ser,que se chateia contigo e passa meses sem te falar,mas regressa sempre a casa.
Sei que a adoras tal como a todas as outras que te visitam,e que já viste chorar e sorrir,cantar,gritar e fugir.
As estradas ainda me confundem porque poucas foram as vezes que te abracei sóbria,propositadamente fazes-me perder e encontrar,subir e descer.
Salvaste-me e deste-me simultaneamente a faca com que cortei os pulsos docemente.Não seria justo agradecer-te,deus se existe sabe que não sou boa,mas prometo-te isto,e como sabes tenho talento para quebrar copos,não promessas.
Prometo-te que hás de ser sempre,para sempre,o meu refugio.Tal como da primeira vez.

quarta-feira, outubro 17, 2007

O vestido

Lá vai ela lavada em mantos de revolta.
À medida que sai pela porta do prédio,mete os óculos de sol baixando suavemente a cabeça,para que ninguem veja os olhos inchados,e as bochechas vermelhas de quem não gritou.Coloca o som do mp3 no máximo e dirige-se para a paragem do autocarro serenamente,como se não fugisse.
Acende um cigarro,olha à sua volta em gesto de despedida.Uma despedida dolorosa de um sitio que se obrigou a odiar,de forma a ser mais fácil a partida.
O autocarro chega,e disfarçadamente vai-se afastando do resto das pessoas,para que não lhe toquem.Como ela detesta o toque...
Senta-se junto à janela,enquanto faz força com as unhas na mala de ganga cheia de pins alegres,fazendo antítese ao seu constante e instavel estado de espirito.O Sol fa-la chorar em segredo,e a multidão continua egocentricamente afogada nas suas próprias futilidades.Observa o caminho como flashes,decora as casas,as àrvores,os cafés,o céu quente.Os flashes avançam impiedosos misturados com imagens longos minutos mais antigas.Existem comprimidos de todo o tipo espalhados pela mesa,e vidros,e coisas partidas.Existe um prédio branco todo ele familiar,com crianças a jogar à bola em seu redor.Existe violência,culpa e ameaça.Egoísmo...E um grito que nunca silencia.
Quando o autocarro está a chegar ao seu destino,ela limpa cuidadosamente sem se notar,as suas lágrimas salgadas,ajeita as ondas do seu cabelo cor de chocolate para o lado,e corre.Corre desenfreadamente para o comboio que a leva dali para fora.Onde ninguem a conhece,onde quase,quase se sente em casa,e ensaia o sorriso que vai ter de colar nos lábios nas próximas horas,até que a noite caia,quando já ninguem repara.
Lá vai ela desligando os flashes.Sugando energias de sonhos que sabe bem nunca vir a realizar,energias que a fazem esquecer por momentos o medo de voltar àquela casa.Dona das culpas e dos ódios.Onde apenas se ouve um unico grito,irritante e melódico.
Um grito que nunca se cala...

terça-feira, outubro 16, 2007

O ultimo grito

Acabou.

20 years are long enough...

Pausa

...E se isto já não tem mais para dar?
Ando a perder tempo olhando para um relógio que já não dá horas há mais de um ano,talvez nunca tenha dado.
Sou o que mais odeio,uma pessoa vulgar.Mais uma miuda.
...E se eu já não conseguir exprimir-me por palavras como antes?
O tempo passa e nada muda.Esgota-me ouvir "só depende de ti",tretas.Não depende só de mim.Há coisas que não se controlam,e eu não controlo as minhas emoções,sou instavel,doente.A tradução da expressão para português não lhe faz justiça.
Preciso de férias de mim.
...E se eu não escrever mais,que é que faço?
Não gosto de ler,faz parecer as horas mais longas.Não tenho onde chegar mas ainda anseio descobrir onde me levam.
...E se estiver farta do mesmo?
Ando a perder tempo sem necessidade.Embora precise mais que o ar qualquer coisa que nem eu sei o que será.
Perdi o jeito...Foi-se.
Melhor é impossível.

segunda-feira, outubro 15, 2007

Aquele momento

Há sempre um momento,aquele momento.Há sempre um instante por mais pequeno que seja em que podemos escolher.A escolha por mais dificil que seja surge sempre,há sempre uma.Apenas nos esquivamos dela por ser mais fácil cair,escolher o caminho mais fácil,e ceder.
Não sei bem qual será entendido o caminho mais fácil,parecem-me os dois demasiado complexos e caprichosos.
Diz o filme que existe sempre um momento,por muito breve que seja,em que podemos desenvolver a nossa escolha.Eu acho que o meu ainda não chegou,devo admitir que já começo a insistir tanto na indecisão que parece desculpa,quando é uma fuga.
Não sei se já passou o meu,se ainda está para vir,ou mesmo se estou a passar por ele neste preciso segundo em que já escrevi meia duzia de frases confusas sem sentido romântico ou gramatical,mas uma coisa posso garantir,se esse momento chegar e eu der por ele,não vou repetir-me.
Há sempre um momento,3 saídas:
"Eu consigo fazer isto."
"Eu vou deixar-me levar."
ou...
"Eu consigo resistir."

domingo, outubro 14, 2007

Manchas

...Há cores que não se enterram.Escondem-se.
O cor-de-rosa às vezes tansforma-se em vermelho,depois volta ao seu lugar.Sou eu que o misturo?Sou eu que o faço clarear outra vez?
O cor-de-rosa pode ser perigoso quando é choque,depois entendo por bem faze-lo esconder-se.
O cor-de-rosa não sou eu,sou quem gostava de ser.Não sou.Será que sabes?
O cor-de-rosa é uma capa de sentimentos puros,que às vezes se sujam...Sem que eu o deseje.Ou será que desejo?
O vermelho é a mancha na minha cor mais regular,depois o tempo passa,a presença desvanece,e tudo fica claro novamente.Será que era melhor continuar suja?
O vermelho é o sangue derramado pela pureza da metáfora imperfeita,consegues entender?Eu não.
O vermelho às vezes aparece,desculpas-me por não o conseguir evitar?Já me esforcei tanto...
O vermelho é o que me faz querer que nunca vás,que fique tudo assim.O cor-de-rosa tambem.Que é que isto significa?Já nem eu sei...Nem eu.

sexta-feira, outubro 12, 2007

A casa das culpas

Está sempre tudo tão bem,da porta desta casa para fora.
Esta casa está amaldiçoada,tem o dom de fazer sentir mal quem cá ousar entrar.Deve ser por isso que de repente deixou de ter mais,que as unicas 3 almas que cá vivem.
O quarto negro,desta vez não é o meu.Esconde uma alma quase mais escura que ele,e um cheiro a desesperança no ar.A musica ambiente são gritos e queixas e dores.Desespero.Fora dele,não há mais que um silencio tão doloroso quanto o barulho infernal que lá vai dentro.
O quarto do lado esquerdo é cor-de-rosa.Esconde a 3ª alma da casa.Assombrada por memórias que nunca existiram que não em sonhos.Afogada em insónias de gritos e medos.
Na casa de banho do seu lado direito,pinga incessantemente uma torneira,por falta de forças para a fechar.
Na sala em frente,apenas o barulho surdo/mudo da televisão,onde o mundo lá fora parece uma miragem de alegria inexistente.Uma gata a passear melancólica pelos sofás,miando em busca da atenção,que já ninguem tem para dispensar,e um bar de bebidas brancas intocaveis,apesar da tentação.Uma mesa cheia de comprimidos de todos os géneros,partilhados secretamente pelos 3.
Na cozinha,descansam canecas de chá,e facas aguçadas,à espera que alguem as lave,à espera que alguem tenha força e tempo para o fazer,mas chegam sempre tarde.O açucar já solidifica colando-se à porcelana.
A porta da rua,parece um portal mágico enfeitiçado,pronto a prender quem se atreve a sair.Pronta a praguejar quem torna a entrar.
Está sempre tudo tão bem,da porta desta casa para fora.
No corredor com entrada para todas as divisões,vai deambulando uma menina de olheiras fundas,a quem os gritos do quarto à esquerda não deixaram dormir.O espelho fita-a como se a seduzisse,tentando-a a sair.O espelho está mesmo em frente à porta,ao lado do maldito quarto escuro e bafejado.
As janelas estão fechadas,e as persianas estragadas há anos,sem que valha a pena arranja-las.Trazer alguem para dentro destas paredes enfeitiçadas seria crime.Não há luz nem vento,o ar já mal se nota.
Ouve-se uma musica baixinha do quarto cor-de-rosa,onde tudo parece bem,aparte da traição de uma cor que não lhe faz justiça.
O pingar deliciosamente perturbador,não provem apenas da torneira.A pena tornou-se insuportavel.
Os comprimidos estão em todo lado,e a menina passeia da sala para um quarto e para o outro,dos quartos para a casa de banho e para a cozinha.Vai dar sempre ao pequeno corredor negro e infeliz que não parece ter fim,nunca.
E torna-se tão dificil resistir-lhes...

quarta-feira, outubro 10, 2007

Sabes uma coisa?

Sim,muitas.E eu estou aqui para te lembrar de todas elas quando te esqueceres,se isso acontecer algum dia.
Estou feliz,posso?Às vezes sinto que tenho de pedir autorização para sentir seja o que for,bom ou mau.O meu problema é pedi-la às autoridades erradas.Tu só me autorizas a sentir coisas boas,e eles...Eles só sabem o que sinto de mau.
Hoje estou cansada,ainda não é esta noite que vou dormir,a vampira que há mim está em força.Hoje estou cansada mas não significa que não admita o meu contentamento,aquela felicidade simples temporária sabes?Sabes.
Sim,sabes o mundo aparte do meu como uma esfera.Vais brincando nela enquanto viajas pelo mundo,e um dia,um dia vais poder dizer que conheces o meu por inteiro.Vais saber aquilo que eu não sei.
Sabes uma coisa?Esta não sabes bebé.
Hoje fizeste valer o meu dia por seres quem és.E ontem tambem.E antes de ontem.
Sabes outra coisa?
Amanhã tambem.

terça-feira, outubro 09, 2007

Temos pena

Tenho pena de quando penso ter facilidade em mostrar que gosto,mais me engano.
Tens pena que eu não te interprete as perguntas,da mesma forma que interpretas a minha ausência de respostas.
Eu tenho pena que não sejas feliz,mais que eu.
Tens pena que não consigamos falar como antes,quando não havia segredos nem verdades ocultadas.
Eu tenho pena que mereças mais do que alguma vez tiveste.
Tens pena de gostar mais de mim,que eu de ti,mesmo sabendo que não é assim.
Eu tenho pena de não conseguir mostrar o que antes conseguia todos os dias.
Tens pena que me tenha tornado egocêntrica,mas na realidade sabes que é apenas uma defesa para chamar à atenção.
Eu tenho pena que tenhamos de discutir,para demonstrarmos o quanto estamos ligados um ao outro.
Temos pena,porquê?
O tempo parte os espelhos,mesmo quando as imagens permanecem como tatuagens.

segunda-feira, outubro 08, 2007

Talvez não haja mais ninguem

Talvez não haja mais ninguem,que me consiga ler tão bem como tu fazias,mesmo sem ler.Mas eu preciso de mais,que ser percebida.
Talvez não haja mais ninguem,que me consiga tocar tão bem como tu,mesmo sem cordas.Mas eu preciso de mais,que ser tocada.
Talvez não haja mais ninguem,que me consiga fazer sentir medo,tão bem como tu.Mas eu preciso de mais,que me sentir insegura.
Talvez não haja mais ninguem,que me consiga fazer esperar tanto tempo,como tu fazes.Mas eu preciso de mais que uma espera sem retorno.
Talvez não haja mais ninguem,que me consiga fazer pensar que amo,tão bem como tu consegues.Mas eu preciso mais que amor,e não existe amor no medo.
Talvez não haja mais ninguem,que me consiga agarrar sempre que queira,como tu podes.Mas eu preciso que me agarrem,aparte de vontades.
Talvez não haja mais ninguem,só tu,porque és o unico a não existir.Mas eu preciso mais que uma existencia ilusória.
Talvez não haja mais ninguem,ninguem no mundo.

sexta-feira, outubro 05, 2007

Negócio fechado

Após longas negociações com diversos compradores de feitios dispersos,a licitação mais alta foi a que mais se adequou ao perfil da peça.
O dinheiro como era óbvio não preenchia algo tão insignificantemente caro,e o valor baixo acabava por ser alto à inteligência dos interessados.Não se tratava de uma tarefa fácil uma vez tratar-se de um pertence algo complexo,e consequentemente de uma personalidade complexa.Bens materiais...Bem,há vários tipos de bens materiais.Os vulgares,os significativos e os emocionais.Não pelo seu valor monetário ou social,mas pela importancia que têm para a vendedora em questão.
Neste caso seria um crime realizar a venda com sucesso num presente baseado em aspectos sociais,de imagem,ou de valores.
A venda foi atribuída a um comprador que estava de longe,beneficiado por conhecimento e experiência no campo da peça.Não negociou sequer,porque a primeira oferta foi mais do que suficiente.Estava a anos luz de qualquer oferta que pudesse vir a ser feita.

Desta forma declaro vendida então a minha alma,ao preço de uma garrafa de vodka,à unica pessoa a quem seria realmente capaz de a vender.
...E a unica merecedora legítima de a comprar.
Uma garrafa de vodka,nem sempre é apenas uma simples garrafa de vodka.

quinta-feira, outubro 04, 2007

Vende-se

Vendo a minha alma a uma preço baixo,juntamente com uma oferta de toda a minha solidão ficticia.
Está em bom estado apesar de já lhe ter dado tanto uso,em tão pouco tempo.Ofereço algo importante para quem sente falta de estar sozinho e na verdade está sempre.Eu não lhe dou utilidade porque o meu corpo não tem capacidade de viver nela.A solidão.
Vendo a minha alma a um valor negociavel,nem sempre compensador.Vendo a minha alma a quem a saiba aproveitar,na verdade nunca o fiz.
A solidão já não é jovem,mas a oferta inclui uma garantia de autenticidade que consiste numa tentiva de me conhecer.
Vendo a minha alma,a quem apenas quiser usar a sua embalagem.

terça-feira, outubro 02, 2007

Um crime de cobardia

De alguma forma possível e imaginária,o meu corpo não descolou da cama quente e húmida.Dormi até me arderem os olhos e doerem os musculos.Dormi até a minha janela não falar comigo.
Não pude deixar-me ver a luz do dia nem as pessoas que o rodeiam,não pude fazer dele um dia normal.
De alguma maneira que o ser humano possa imaginar,hibernei.Acordei com a promessa nas costas dos meus olhos de que ia finalmente mudar.Chorei tudo o que não havia chorado anteriormente,e resultou.
De algum modo transcendente adivinhaste que me tentava curar,e atiraste-me o vicio para cima.Encharcada de doença,escorri-me,tentei dar a volta,mas a minha alma estava demasiado escura para a pintar de outra cor que não o preto.
De todas as alternativas que podia escolher,escolhi confrontar o meu medo,gritei até que a voz não saísse pelos meus lábios cor de sangue,mas não obtive resposta.Só queria um não,na esperança vã que ainda pusesse receber um sim.

Nem um,nem outro.
Hoje só queria que desaparecesses para sempre,mas antes,antes dá-me uma resposta.
Prime o gatilho,és tu quem tem a arma na mão.