Diário de uma Paixão

domingo, abril 30, 2006

557

Não consigo chorar.Descobri isso há cerca de uma semana no funeral do meu avô.Apesar de não o ver desde os 15 anos,e da raiva ser tão grande,e o remorso,custou-me acordar com o choro da minha mãe que me dizia "Cátia acorda,aconteceu o pior".Secalhar teria sido melhor que ela tivesse dito "olha filha,o teu avô morreu.Eu tenho noção que te vais sentir culpada,mas tens de ter calma,estas coisas acontecem e nós já estavamos à espera." pois assim talvez de choque tivesse chorado.Não aconteceu.Levantei-me como se nada fosse,abri as persianas,liguei o computador,embora não tenha respondido a ninguem que me viesse falar,fui tomar banho,almocei (que diga se de passagem é coisa que nunca faço,não é habito almoçar cá em casa) e fui para o velório com o unico pensamento que teria de enfrentar pessoas que não via há anos,e que me magoavam,me desejavam mal,e a quem eu odiava por natureza desde que nasci.
Ele não.O meu avô era o homem mais sábio que eu alguma vez poderia ter conhecido,foi mais pai que o meu proprio pai,e os unicos momentos felizes na infancia que posso ter na memória foram passados com ele.Podia descrever agora minunciosamente a igreja,as pessoas e o olhar delas de desprezo,o teatro daqueles que lá foram derramar umas lágrimas e uns gemidos falsos,o tempo chuvoso que se registava nesse dia,o olhar dos meus pais ao verem que todos choravam até eles menos eu,como se de uma desilusão se falasse "a minha filha nem pelo avô chora." enfim...Podia descrever isto tudo em mil posts,mas não o vou fazer porque não vale a pena.Passei a tarde inteira à procura de coragem para ir olhar para o corpo daquele que talvez me amou e mais bem me quis na vida.À noite,quando fechavam a capela,eu aproximei-me e tirei o pano que o cobria,sob o olhar atento de critica dos que lá estavam,e dei-lhe uma festinha na testa.Estava frio,amarelo e magro...Apesar de ser uma pessoa com bastante idade na ultima vez que o vi e de já estar doente,não era a visão que tinha do meu avô.Mas ainda assim permanecia a mesma expressão sorridente que ele usava constantemente,até quando dormia,e que eu orgulhosamente observava e gostava de gabar "aquele senhor inteligente e viajado,smpático,é o meu avô."
Naqueles breves segundos que pareciam anos vi toda a minha vida passar-me pela cabeça,vi todos os erros,todo o ódio,todo o amor,tudo que me foi importante e que me houvesse tocado em 19 anos.Rezei para que uma lágrima caísse,rezei para que toda aquela gente cinica desaparecesse,rezei para que os anos andassem para trás.Eu sou ateia,não rezo.
Toda uma vida me passou pela frente como uma estrada.E eu ali permanecia fria como uma pedra,fria como ele estava ali estendido.
No funeral todos me vieram cumprimentar e todos diziam as mesmas palavras como se de uma obrigação se tratasse "os meus sentimentos".A vontade que mais tinha naquele momento a cada pessoa que me vinha falar era dizer "deixe-me em paz!" eu não preciso de chorar para demonstrar que estou triste,eu não preciso de usar preto para demonstrar que estou de luto.Devem ter pensado "aquela está de preto porque está de luto" porque nem sequer me conhecem,a ultima vez que me viram andavam comigo ao colo.Eu ando quase sempre de preto.
Vi a gaveta a fechar-se como se falasse,como se me dissesse "não te preocupes,não te sintas assim,eu estou melhor agora já não sofro,e continuo a gostar de ti como antes,és a minha unica neta e a maior alegria da minha vida" como ele costumava dizer.E entretanto dizia-me adeus chamando-me de gaiata,e falando em lingua dos p's,ele falava como ninguem...
Tenho medo de o desiludir,tenho medo do que faço.Será que ele se sentiria orgulhoso se soubesse que a neta,a menina dos olhos dele,ainda não tirou a carta,e teve de deixar de estudar para trabalhar porque as coisas estão dificeis?Ou se sentiria culpado porque sempre me quis dar tudo e a uma certa altura o tudo parecia nada?
Sinto-me triste,tenho saudades...como eu odeio esta palavra.

E assim a gaveta fechou para sempre,colada com uma cola especial que aqueles homens de preto lhe puseram,apenas com uma anilha dourada para se ir por flores.Ele adorava flores.Não chorei.Fiquei ao longe a observar aquilo tudo com os olhos a arder do sol,no fundo daquela gente toda cinica,a pensar se algum dia me ia voltar a sentir bem,se é que alguma vez o senti.E a gaveta lá fechou.Igual a todas as outras,branca fria e desprendida de quaisquer sentimento.Era a numero 557.

domingo, abril 16, 2006

André

Virei a página.Tentei mudar tudo à minha volta e consegui.As pessoas eram diferentes,eu tambem era diferente,era cor de rosa.
Porem o interior era o mesmo preto,irritantemente triste,irritantemente "andré".Eras o nome que me fazia colar à pessoa que fui,e acabava por ser sem ninguem perceber.O teu nome assombra-me todos os dias,não houve um unico dia em que não me lembrasse das tuas palavras...Não houve uma simples e unica pessoa que me fizesse escrever como escrevia para ti.Foste,és e serás mais que um nome.Anseio todos os segundos pelo regresso do negro.
Sou egoísta porque te quero de volta.Quero-te de volta mesmo sabendo que nunca terás paciencia para ler estas linhas.Quero-te de volta mesmo arriscando as tuas bruscas mudanças.Escrevo porque sei não me servir de nada falar.Gostava de voltar atrás e compreender o incompreensivel rapaz que gostava de mim,mas não me podia dar o que queria.E eu disse tanta vez "gosto de ti"...Não me serviu de nada,mas gostava de sentir que as minhas palavras eram diferentes.E o medo...O medo de te tocar e ser unica.O medo que não me cortava a depressão e a escuridão onde vivia e ainda vivo.
Escrever sob efeito de comprimidos sem pensar que as folhas fogem de mim.Saudade...
Diz-me agora o que querias dizer naquelas entrelinhas.Sim!Eu sei que ambos somos outros e que a cama,a droga e o alcool não curam tudo,mas fazem-me viajar no tempo para a mesma cadeira onde te escrevia todos os dias aqueles "gosto de tis" simples e sinceros,cor de rosa.A minha cabeça cai para trás,não tenho força para agarrar a lapiseira.Sinto-me como que apagada.Fraca.Tambem te disse que o era.Não há palavra nenhuma que não me faça lembrar de ti...Não há nada.
Sente-me!Por favor volta...André.
Não mudes de página.Sou tigre...

Não sei que dia de Abril de 2006,3:50 no meu relógio adiantado 15 min ou mais.Na minha cama por fazer,sob efeito de comprimidos pra constipação,com saudades tuas e medo...ao som de "the leaving song - AFI".

sexta-feira, abril 07, 2006

Tanto tempo...

O tempo cura tudo,dizem.Será que é assim mesmo?Tanto tempo...As mesmas horas,os mesmos fantasmas,será que isso tudo desapareceu?
Os comprimidos não curam tudo,apagam por momentos esta existencia mais que dolorosa de "tempo".Não há flores nem anjos nem palavras doces,existe mágoa,saudade,magia...Eu dir-te-ia o quanto me magoa se voltasses à mesma pessoa que outrora foste.Gostas que te chame pelo nome mas nunca me perguntaste porque o fazia.Sempre te dei importancia como pessoa,sempre pensei que eras diferente do mundo em que me encontrava,era isso que fazia de ti especial.E viver sem essa magia agora é um vazio de vida que me completa.Sinto-me egoísta porque te quero de novo.Não morreste mas...fizeste um esforço por isso e eu ajudei ao afastar-me.Ninguem vai perceber isto,sabes porquê?porque tal como um dia te disse,nem eu me compreendo,quanto mais fazer juízos dos outros.Espero porque...ainda tenho esperança que voltes,e quando voltares eu vou estar aqui numa espera interminavel,eles mentem.O tempo não cura tudo.

Tanto tempo e mesmo assim...

"I'd share with you, could I only speak, Just how much this hurts me..." AFI - This time imperfect