Entrevista com o desconhecido

A cadeira parecia de metal enferrujado ao cortar-me as pernas por baixo das meias de padrão xadrez.
Estava à espera de alguem,provavelmente uma pessoa desinteressante e profissionalmente fria,mas nunca se sabe.Em volta as paredes nuas e escondidas em plantas artificiais,faziam-me sentir num sonho.Observava lentamente os meus gestos de fora do corpo e dizia baixinho: "Aguenta."
Por fim um som.
Ecoava no silencio como um tiro.Que "boa tarde" mais luminosamente falso.Só conseguia pensar em quem seria realmente o ser humano por baixo daquela gravata.Teria familia?Amigos?Amantes?Seria algum menino molestado em criança que conseguiu subir na vida?
Respondi amavelmente,sem forçar a voz.Vi esboçar um sorriso,e até que enfim algo honesto saía daqueles lábios.
Gosto de perguntas.Excitam-me.As respostas perdem-me o desejo pelo caminho.
Curtas e directas,foram as que dei.Satisfatoriamente vi aquele ser desabrochar entretanto,queria saber mais,queria desenterrar o que eu pretendia manter bem fundo.Sem sucesso,mantive-me submersa por um mar de pecados e mentiras sob controlo de um desconhecido.
Ironia do destino,os estranhos são sempre mais interessantes que os óbvios.Qual é a piada de mergulhar,quando já sabemos onde se encontram as rochas?
Agora que acabou,e já não posso voltar atrás,gostava de ter feito eu mesma uma ultima pergunta:
"Que queres de mim?"